terça-feira, 19 de março de 2013

JORGE AMADO

Escritor brasileiro, nasceu em Piranji, Estado da Bahia, em 1912.

Passou a infância em Ilhéus na região cacaueira, presenciando as divergências e lutas entre os trabalhadores do cacau e os fazendeiros.

Estudou algum tempo em Salvador, no Colégio Antônio Vieira, de onde fugiu, voltando a prosseguir os estudos no Colégio Ipiranga.

Seu ingresso no jornalismo deu-se em 1930, no Rio de Janeiro, quando iniciou o curso na Faculdade de Direito. Em 1931, lançou seu primeiro livro: O País do Carnaval.


Escritor regionalista, Jorge Amado recebeu muitos prêmios. Suas obras foram traduzidas em muitos idiomas, e muitas delas levadas ao cinema e televisão. Foi o autor do poema É Doce Morrer no Mar, com música de Dorival Caymmi.


É membro da Academia Brasileira de Letras onde ocupa a cadeira nº 23.

Outras obras de Jorge Amado:

Suor
Jubiabá
Mar Morto
Capitães de Areia
Terras do Sem Fim
São Jorge de Ilhéus
Seara Vermelha
Gabriela, Cravo e Canela
Os Velhos Marinheiros
Os Pastores da Noite
Dona Flor e Seus Dois Maridos
Tenda dos Milagres
Tieta do Agreste...

... e outras obras , incluindo biografias, peças teatrais e poemas.

DO PÁSSARO SOFRÉ

Já não podia mais Nacib, perdidos o sossego  a alegria, o gosto de viver. Deixara até enrolar a ponta dos bigodes, murchos agora sobre a boca de riso perdido.  Era um pensar sem fim, nada igual para consumir um homem, tirar-lhe o sono  e o apetite, emagrecê-lo, deixá-lo sem graça, melancólico. 

Tonico Bastos debruçava-se no balcão, servia-se do amargo, olhava irônico a figura abatida do dono do bar: 

- Você está decaindo, árabe. Nem parece o mesmo.

Nacib assentia com a cabeça, num desânimo. Seus grandes olhos arregalados pousavam-se no elegante tabelião. Tonico crescera em sua estima nesses tempos. Sempre tinham sido amigos porém de relações superficiais, conversas  sobre mulheres da vida, idas ao cabaré, tragos tomados juntos. Ultimamente, no entanto,  desde a aparição de Gabriela, estabelecera-se entre eles uma intimidade mais profunda. De todos os frequentadores diários do aperitivo, era Tonico o único a manter-se discreto na hora do meio-dia, quando ela chegava de flor atrás da orelha. Apenas a cumprimentava delicadamente, perguntava-lhe pela saúde, elogiava-lhe o tempero sem igual. Nem requebros de olhos nem palavrinhas sussurradas  nem tentava tomar-lhe da mão. Tratava-a como se ela fora respeitável senhora, bela e desejável, porém inacessível. De nenhum outro temera tanto Nacib a concorrência, ao contratar Gabriela, quanto de Tonico. Não era ele o conquistador sem rival, o tombador de corações? 

O mundo é assim, surpreendente e difícil; mantinha Tonico a máxima discrição e respeito na presença excitante  de Gabriela. Todos sabiam das relações do árabe com  a formosa empregada. É verdade, que oficialmente, ela não passava de  sua cozinheira, nenhum outro compromisso entre eles. Pretexto para cobrirem-na, mesmo na sua vista, de palavras doces, envolverem-na em frases melosas, meter-lhe bilhetinhos na mão. Os primeiros eles os lera displicente, fizera bolinhas de papel, e os atirara no lixo. Agora despedaçava-os raivoso, eram tantos, alguns até indecentes. Tonico não. Dava-lhe prova de verdadeira amizade. a respeitá-la como se ela fosse senhora casada, esposa de coronel. Era ou não era amizade, sinal de consideração? Nacib não o ameaçava como fizera o Coronel Coriolano a propósito de Glória. No entanto, só de Tonico não tinha queixas e somente para ele abria seu coração doloroso como túmida espinha. 

- A pior coisa do mundo é um homem não saber como agir.

- Onde está a dificuldade? 

- Você não vê? Fico me roendo por dentro, isso me come as carnes. Ando apalermado. Basta lhe dizer que outro dia me esqueci de pagar um título, veja como ando...

-  Paixão não é brincadeira...

- Paixão? 

- E não é? Amor, a melhor e a pior coisa do mundo.

Paixão... Amor... Lutara contra aquelas palavras dias e dias, a pensar na hora da sesta. Não querendo medir a extensão de seus sentimentos, não querendo encarar de face a realidade das coisas. Pensava ser um xodó, mais forte que os outros, mais longo de passar. Mas nunca penara tanto por um xodó, jamais sentira tais ciúmes, esse medo esse pavor de perde-lá. Não era o temor irritante de ficar sem a cozinheira afamada, em cujas mãos mágicas assentava grande parte da atual prosperidade do bar. Nem pensara mais nisso, essas preocupações duraram pouco tempo. Se ele próprio perdera o apetite, andava num fastio medonho... 

O CARNAVAL NA BAHIA

Mas o carnaval se aproximava. Fazia um ano ela saíra numa prancha "Felizes Borboletas", saíra linda, era a mais linda na mais linda prancha. Naquele tempo o carnaval da Bahia era feito principalmente pelas pranchas, bondes enfeitados de  flores e papel, lotados de moças fantasiadas que corriam todos os itinerários dos trilhos, levando a alegria a todas as ruas e arrastando atrás de si os autos dos rapazes elegantes. Havia prêmios para as pranchas mais animadas e para as mais belas. Cinco anos eram passados desde que, pela primeira vez, a Família Cordeiro fizera a prancha das "Felizes Borboletas". E nesses cinco anos por duas vezes  a prancha tirara o prêmio de beleza,  por outras duas de animação, perdendo uma única vez "à mais deslavada injustiça jamais praticada sobre o céu da Bahia", como afirmava Reinaldo dos Santos Ferreira, amigo da família e pai de duas felizes borboletas. 

Maria dos Reis, quando víera morar naquela rua, ficara amiga de Antonieta Cordeiro, e das suas quatro irmãs. Mas principalmente, de Antonieta, que era uma simpatia de morena, alegre e viçosa, namoradeira como ela só,  dona da risada mais clara de todo o Largo de 2 de Julho. Fora assim,  não só membro como uma das animadoras e entusiastas, das "Felizes Borboletas" naquele ano. E como esguia e pálida, a fantasia foi-lhe muito bem,  e divertiu-se imenso nos dois primeiros dias. No terceiro, já de namoro forte com Teodoro, a alegria foi diferente, um pouco menos ruidosa, porém mais densa.  Terminaram dançando até de madrugada na casa dos Cordeiros, festejando o prêmio. Teodoro, dissera-lhe então que o prêmio tinha sido conferido,  principalmente devido a ela, à sua beleza, à sua voz, à sua graça radiante. 

DOCUMENTÁRIO SOBRE JORGE AMADO... 

PARTE 1 


PARTE 2

Nenhum comentário:

Postar um comentário